Dead Woman Walking

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Local: São Paulo, São Paulo, Brazil

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quarta-feira, novembro 01, 2006

Wine in the Afternoon

E você cria o esteriótipo. É perfeito. Todos são.
Aproximações são inaceitáveis. Estragarão tudo. Devo ficar afastado, sem sons, sem movimentos (bruscos), apenas as sombras que consigo perceber do meu canto, quieto.
As semanas perdem os dias, e os dois cada vez mais juntos.
Os exercícos de física já não importam. Ele não precisa mais dessa desculpa, ou de nenhuma outra. Ela gosta do que ele fala, do que ele faz mesmo quando inerte. Ela gosta sim. Ela sorri. Eu sorrio.
[resquícios de esperança]
Vejo-os de mãos dadas. Beijos tímidos, carinhos, meiguices, piegas, piegas...
[e tudo dará certo]
Dias coloridos ressurgem. Músicas alegres, dentes que saltam, olhos que brilham.
O casal que é a minha fluoxetina.
[sim, tudo dará certo]
Passado o período de euforia alheia, continuam na mesma ala, mas em carteiras distantes. Precisavam de espaço. Ela o prendia. Ele a sufocava.
Mais 72 horas. Ele ao fundo. Ela à frente.
Não mais se olham, nem um bom dia. Nada.
[ruínas]
São Paulo voltou à sua cor habitual. O daltonismo prevaleceu.
Não havia músicas furtacores, dentes saltitantes, brilhos no olhar.
Talvez um psiquiatra...
E tudo deu errado.
[eu nunca acreditei]

quinta-feira, julho 13, 2006

Plangente


Passo de White Rabbit para White Horse.
E faz todo sentido.
Queria ser Grace Slick.
Queria ter escrito essa letra.
Queria filmar Platoon.
E tudo seria pesadamente colorido.
"This song is about acid".
"Claro, tudo era sobre ácido naquela época".
Queria ser Grace Slick.
"Não. Puro, por favor".
No canto do quarto escuro... é meu.
Eu sou Grace Slick.
E faz todo sentido.

quarta-feira, maio 03, 2006

Morbidez de Um Anjo

Arranco do meu crânio as nebulosas.
E acho um feixe de forças prodigiosas
Sustentando dois monstros: a alma e o instinto!
(A Dança da Psiquê - Augusto dos Anjos)

Andando naquela estrada-de-terra, suja até os últimos fios de cabelos amarelos que saíam de um crânio perplexo, pensava sobre a noite anterior. Não descobriu, não compreendeu.
E foi assim o caminho todo: rastejando sem perceber que o sangue lhe escorria dos joelhos; que o barro pintava seus pés, que rodopiaram tão graciosamente com Ele.
Lapidava com o olhar o par perfeito que a tirou para dançar e entre conversas sobre um nada-cult-pós-moderno a convenceu. Saiu de lá. Saíram.
Duas taças em cima da na mesa. Preferiu um copo com whisky, puro; ao som de Miles Davis, lembra-se de Hilda Hilst-"porque há desejo em mim, é tudo cintilância..."- e o início de um breu, não somente na sala, mas em tudo o que via. Estava bem, estava muito bem. [apagou]
Machucada no corpo e na alma foi cambaleando pelo nada à procura, não de ajuda, não de consolo, mas de alguma lâmpada acesa para limpar os pés (tão bonitos) e enxugar as lágrimas que borravam o trabalho de quase 2h em frente ao espelho.
Nunca antes a vergonha tinha lhe batido com tanta força. Desejava a morte de todos os entes para que não a vissem padecente, indecente. Desejava ainda mais a sua morte.
Um posto policial: estacionou por lá. Não lhe restava dinheiro, não lhe restava dignidade. Inventou uma história de um assalto qualquer e, após toda a burocracia brasileira, foi levada para casa.
Não saiu de seu reduto até que todas as marcas arroxeadas de seu corpo desaparecessem.
Ninguém sabe. Ninguém, jamais, saberá.

quinta-feira, abril 27, 2006

Nostalgia Inanimada

Foi como quando tinha três anos. Ingênuo. Delicado. Pueril.
Tudo outra vez: olhos brilhando, sorriso escancarado, face rubra.
Lembrou como era divertido ver coelhos nas nuvens e imaginar qual o sabor delas e quantos coelhos iriam visitá-la no dia seguinte. E todas as tardes ficava no quintal olhando o imenso azul e seus branquinhos felpudos. Gritos transbordavam de seus pequeninos lábios, jogados ao vento, tamanha a alegria trazida pela observação. Até que um dia eles não vieram. E ela esperou:

- Será que erraram o caminho?

Esperou:

- Será que algo de ruim aconteceu?

Esperou:

- Será que eu não sou especial para eles?

E esperou:

- Está muito frio aqui, vou para o quarto.

Quando abriu os olhos estava com um cigarro aceso entre os dedos, uma xícara de café em cima de uma mesa pastel cheia de burocracias pendentes, com um quadrado cor-de-gelo que pedia a senha para acessar os débitos, dentro de um cubículo em meio a tantos outros.
Olhou para todas as paredes que a rodeavam, como um filhote na caixa de supermercado logo que é privado do aconchego de sua mãe:

- Paredes tão finas. Devem ser de plástico, do mais vagabundo. Não, pelo salário que ganho devem ser de papelão.

E teve a certeza de que os coelhos jamais voltariam.

quarta-feira, abril 19, 2006

I'm Talking About My Generation

Tire as lentes azuis, as unhas vitrificadamente vermelhas, os 7kg de pó-compacto, o rímel preto, o blush, o gloss, o deliniador.
Anteceda as cirurgias, as próteses, as retiradas, os preenchimentos, as reerguidas, os ossos calculadamente quebrados.
Era luz, era pura, era suficiente, era ela.

Foram eles: os outros.
Foi ela: a efemeridade.
Foi o mundo com seus desacertos, a fraqueza humana para tudo o que lhe é alheio, a visão dionisíaca.
Preceda o surgimento do Universo: fomos nós.

E, após toda a tecnologia aplicada em um ser quase humano, somente resta a subsistência plastificada.
E ela, deteriorada, ignora todos os indícios de sua frívola realidade.
Tornou-se subconjunto de qualquer conjunto.
Conjunto vazio.

quarta-feira, março 29, 2006

Além do Ponto de Fusão

Todas as tardes: os chocolates, a água gelada, as pedras de gelo. Às vezes um suco, mas sempre as pedras de gelo.
Roendo as unhas da mão esquerda, escreve com a direita: "Felidae, porque família termina em idae, segundo a regra de nomenclatura binomial proposta por Lineu".
Pausa. Encara a parede cheia de retratos que resumem a vida ativa de sua irmã. Profundo suspiro. Mais chocolates. Agora, o preferido, pedacinhos de açúcar e cacau que adoçam e ferem seus dentes, sensíveis pelo excesso de glicose e gelo, muito gelo.
Sempre magra, por sorte ou ruindade, tentando se encaixar, não num lugar, mas num tempo. Come, lê, come, relê, come, come...
A digestão nunca foi fácil para ela, de todas as coisas do mundo. Pára, percebe, analisa, contrai. Com a cervical em C e a lombar em S, acende a luminária (e a escrivaninha cada vez mais cinza, cada vez mais grafite, cada vez mais rascunho), abre o único livro espiralado que gostaria de não ler e o lê, fervorosamente, 6 horas por dia, até que o jantar fique pronto, até que o chuveiro esquente aquela água clorada, até que um amigo (que reconhece suas marcas invisíveis) on-line pergunte: "como você está?" e ela responda: "tô bem, tô indo...".
Olha agora para o teto, cheio de falsas estrelas e explica para si porque elas brilham no escuro: "são os elétrons excitados voltando para as camadas menos energéticas e liberando ondas eletromagnéticas em forma de luz". Permite-se, por um instante: "quando foi que tudo ficou tão vazio?".
Enche mais um copo com gelo, muito gelo.

sexta-feira, março 03, 2006

Anatomia Fisiológica

Esses pés...onde estarão esses pés?
Esses pés que regozijaram tantos dias nublados.
Esses pés que, embaixo de meus pés, iam muito além de metatarsos e falanges.
Esses pés que se tornaram um esporão para as sinapses outrora bem elaboradas.
Esses pés encontraram outros pés, mais delicados, burlescamente refinados, devastando qualquer possibilidade de calçar em delírios o antigo par.
Estes pés procuram novos pés.
Pés que não os abandonarão.
E, quando (se) a busca cessar, saberão que aqueles pés não passaram de membros inferiores.